Por Valdinete Ferreira

Realizar o trabalho voltado para pessoa em situação de rua, requer uma habilidade às vezes fora do comum. Quando se trabalha em uma empresa lidando com máquinas, peças ou qualquer tipo de objeto inanimado o trabalho tem hora para acabar. Bate – se o ponto e vamos para casa cuidar de outros afazeres, cuidar da família sem nem pensar nas peças que ficaram lá na fábrica.

Agora quando o material de trabalho é um ser humano que perdeu a sua identidade o trabalho é bem diferente. É preciso ter amor e muita dedicação para cuidar dessa peça (pessoa) que precisa ser totalmente restaurada. E como restaurar alguém que na maioria das vezes já perdeu grande parte de todos os sentimentos que ela possuía, só lhe sobrou a vida?

Então é com essa vida que temos de trabalhar. Começamos cuidando do corpo, cansado de perambular sem um local adequado para o descanso, sem a roupa apropriada para o seu aquecimento. Cuidamos das feridas, esse corpo muitas vezes traz cicatrizes de maus tratos, quedas sofridas pela embriaguez, brigas por motivos banais. Faminto por uma refeição saudável, saborosa. Essa é a parte mais fácil e qualquer pessoa de boa vontade consegue exercer essa função.

Depois da primeira etapa realizada vem o grande desafio: cuidar desse interior, ouvir sua história que na grande maioria traz muito sofrimento, lembrar dos traumas, das perdas, das violências sofridas… Relatos que doem na alma ao serem ouvidos, e o ouvinte tem quer ser firme para não chorar na frente de quem narra, pois ele precisa encontrar forças na pessoa que ouve para que ela consiga continuar e talvez encontrar uma saída para sua vida, uma resolução para sua história.

Neste momento, pode nascer um fio de esperança para uma transformação de vida. Depois de tudo isso, esse trabalhador tem que ter sabedoria para separar a sua vida, da vida que ele acabou ouvir. Fácil?

Quase impossível voltar para casa e não levar a história. Nasce então a vontade de transformar aquela vida, e começa uma corrida contra o tempo para que aquele irmão não desista da oportunidade de um recomeço pois faltam condições, falta amparo, falta o poder público para agilizar as coisas e, neste meio tempo, o cidadão desiste volta à estaca zero, pois não aguentou esperar.

O sentimento de impotência nasce. A tristeza passa a fazer parte da vida desse profissional, mas o desejo de cuidar é maior, a caridade faz parte dele e outras tantas histórias precisam ser ouvidas, tantos outros precisam ser cuidados e, com cada um deles, renasce a esperança de uma vida transformada.

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